O Audiovisual em Xingu: Contatos – Parte 2

Continuemos com a de Gisele Farias:

Uma representação autêntica e fiel da emancipação e luta dos povos indígenas através do audiovisual

 

Durante muito tempo, o homem branco segurou a câmera que apontava para a história dos povos indígenas, escolhendo o seu olhar como única lente para o que ocorreu durante e após a colonização do Brasil. Na Avenida Paulista, em um dos maiores acervos de fotografia da América Latina, o Instituto Moreira Salles, a exposição “Xingu: Contatos” quebra esse paradigma e mostra o povo do Xingu como detentor e protagonista de sua história através do audiovisual.

É importante ressaltar que na curadoria dessa exposição está Takumã Kuikuro, cineasta e produtor indígena, o que já demonstra que a visão ali representada é de autoria própria dos antes considerados “objetos” da fotografia. Ele reforça, em uma das entrevistas, que a exposição serve para mostrar, através de sua própria perspectiva, os problemas sofridos, não somente pelo povo Xingu, mas pelos demais povos indígenas do Brasil. E a exibição cumpre muito além desse:  consegue representar a emancipação e a luta desses povos. 

 

A escolha de fotos do Acampamento Terra Livre de 2013 mostra como a fotografia pode ecoar por anos durante a história sem deixar de passar seu significado, mas, pelo contrário, ser utilizada para novas representações e novos significados. Essa abaixo, em específico, foi tirada com um recorte muito importante: ao mesmo tempo que vemos a emoção e expressão marcante da líder indígena como foco da fotografia, entre na imagem a barreira de policiais e os telespectadores no plano de fundo, que, assim como em nosso país, continuam a observar sem reação a repressão dos povos indígenas.

 

Uma preocupação ao visitar o primeiro andar da exposição foi quanto ao perigo que a oralidade, muito presente na cultura dos povos indígenas, pudesse sofrer com a recente chegada do audiovisual e da fotografia, criada pelo homem branco, dentro das aldeias. Porém, relatos do povo Xingu na 2ª parte da exposição contam como o registro fotográfico ajuda a protegê-los justamente do apagamento de suas existências: 

“o audiovisual é uma ferramenta muito importante hoje porque nos ajudar a preservar tudo o que a gente tem” 

(Pirakumã Yawalapiti).

Deste modo, a mostra fotográfica consegue explicar a transmissão da oralidade e a passagem para o audiovisual entre as gerações dos povos indígenas, sem deixar de lado a importância e o significado da primeira – mas reforçando a potência dos registros fotográficos como forma de resistência e preservação, inclusive, das origens da comunicação tradicional desses povos. 

Os jovens das aldeias do Xingu aprenderam a utilizar as câmeras, e agora as utilizarão para manter vivas as memórias de seus ancestrais para que o povo branco não esqueça sua existência e queira destruir suas florestas. Isso é representado nas fotos abaixo, que apresentam, com trações marcantes, a geração mais velha e os jovens, ou seja, o futuro do povo Xingu.

A utilização de fotografias antigas em preto e branco representam um passado de luta, mas que, justamente, permanece na história dos povos indígenas e, quando transcorrem para o presente, mudam de cor: ganham a vida que precisam e a mudança que representam. Ao fazer essa passagem de tempo e mostrar fotos de vários artistas e épocas diferentes, a exposição reforça o fato de que a fotografia se transforma e se adequa conforme as mudanças da sociedade.

Brasília, 31.05.1988. Foto de Beto Ricardo/Acervo Instituto Socioambiental.

 

 

 

 

Portanto, é inegável a qualidade do trabalho da curadoria e dos fotógrafos representados na exposição “Xingu: Contatos”, que marca, com imensa responsabilidade, os primeiros e gigantescos passos do audiovisual de produção indígena. Em um dos vídeos da exposição, podemos ver o processo de criação do que se tornaria a exibição e acompanhar isso nos faz sentirmos parte da transformação da história e da fotografia.  

A técnica utilizada na exposição é muito eficaz, já que a fotografia cumpre com o seu papel e os vídeos e documentários, dispostos de forma a mostrar o decorrer da história dos povos indígenas, primeiro através do olhar do homem branco e europeu e depois pela lente dos próprios donos dessa luta, comunicam a mensagem desejada. Não escondem ou apaziguam a verdade nua e crua – conversam com o espectador e com a sociedade, sem deixar de dizer: agora os povos indígenas estão ocupando não somente a política, as escolas, mas a arte e a cultura, inclusive a fotografia e o audiovisual. São donos de suas histórias e não têm medo de contá-la.

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Um respiro com Buava…

Autor(es)

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Meu nome é Gisele, tenho 19 anos, sou estudante de jornalismo do 1º semestre da FAPCOM, estagiária de comunicação, ativista socioambiental, apaixonada por literatura, fotografia e política. Adoro escrever e debater sobre questões sociais – o jornalismo é a forma com a qual consigo juntar essas duas paixões e me comunicar com o mundo.

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